...quero falar de
você. Você que me pescou dentro de uma garrafa perdida no
mar... e me contou a história num poema. Nunca vi
descrição mais real de um encontro tão certo e ocasional
ao mesmo tempo.
Eu estava me
debatendo no mar da vida, talvez procurando uma garrafa
para me abrigar e evitar o afogamento precoce. Escrevi a
uma lista que discutia um assunto específico, contei o
que pretendia ali, o que buscava. Minha angústia era o
mundo, a gente toda que abria mãos de seu próprio
pensamento para acreditar e se agarrar a ilusões, talvez
mentiras forjadas. Quando fiz isso eu não sabia que já
me colocara numa garrafa destinada ao mar. O que eu
esperava? Uma resposta do mentor da lista: estava ou não
aceita? Minha carta foi publicada. Para minha surpresa,
várias pessoas responderam, entre elas você. E não foi
por puro acaso que eu o escolhi. Senti você como
especial de imediato, nem sei porque. Ou sei? Havia um
toque de entrega naquela resposta. Vislumbrei uma
maturidade inusitada em alguém que se dizia tão jovem.
Mal sabia eu que a garrafa tinha sido encontrada, eu
dentro dela, sincera e aberta. Mal sabia que eu mesma
gritara por socorro lá dentro e exigira a resposta. Você
entendeu e atendeu.
Dias depois o
primeiro telefonema. Apresentações nada formais para um
primeiro papo. Um clima de calor que parecia familiar.
Ao falarmos do assunto comum a gente entregava um ao
outro conceitos de vida e de morte, alegrias e angústias
de nossas almas. O papo foi longo e eu tive a certeza de
que estava apenas no começo. Acertara. Os telefonemas se
repetiram e, aos poucos, era como se a gente sempre se
conhecera. Graças a eles o mar de minha vida encontrou
calmaria. Eu já tinha com quem contar. Você me preenchia
ao telefone e continuava preenchendo depois de
desligar.
Agora você me
manda um poema e eu descubro o que já sabia: uma amizade
sólida fora construída em tão pouco tempo que até nos
assustou. Percebemos que tempo não quer dizer nada, o
que manda é o afeto sincero que tivemos a coragem de
valorizar e cultivar.
Entrego o poema a
você, meu leitor:
“Para Sal
Uma mensagem,
como aquelas em garrafas,
perdida em um
mar de zeros e uns, pedia ajuda, me chamava.
Dos meus
pensamentos não conseguia tirar,
aquele
chamamento ecoava em minha mente. Responder era uma questão de
tempo e inspiração, obrigação e sentimento.
Trazia-me, cada
mensagem trocada, um novo pedido e descobertas. Identifiquei-me com a
rementente, parecia que eu a procurava e
ela a mim, há tempos.
Quantas
afinidades em tão pouco tempo,
já conversávamos
por telefone e o tempo era contado em
horas ou nem era.
Círculos, minha
mente girava. Aquela bonita amizade era
como um ímã e nós feitos de ferro. Muita intensidade em cada
palavra trocada.
"Sei, entendo..."
Entendia e era entendido.
Nunca tive tanta
liberdade para falar e ouvir o que precisava. Uma amizade viciante e
saudável.
Se te ligar fosse
impossível, eu me conectava em pensamento. Lia seus textos e admirava
sua história. Cada dia uma surpresa.
"Oi..." era como
atendia, quando entendia minha saudação apressada. Sinceridade... um
diferencial, que para nós é a base. Reciprocidade.
Novato e
veterana, o tempo poderia ter sido mais generoso
conosco. As linhas dessas vidas se
tocando em suas extremidades...
Desilusão e
esperança se misturam.
Desejo que esse
encontro possa durar por muito tempo, Nem sempre a gente pode o que
quer. Pouco ou muito, o que importa
é que estamos marcados por esse belo encontro.
Com muito
carinho,
William Kitzinger
Costa”
Você me
enterneceu, William. Estamos conectados definitivamente.
Não importa o tempo. Não importam as diferenças de
idade. A sua juventude caiu perfeitamente em mim. A
minha velhice recebeu e sorveu seu sangue novo e prenhe
de vida. Isso jamais terá fim.
E o leitor estará
perguntando: e a lista de discussão? Respondo: mas quem
foi que falou em lista? Ah, a lista foi só um pretexto
da vida ou de nossos corações incorrigíveis...
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